Li por aí – não sei onde nem quando – que não se deve ficar revendo fotos do que passou, relembrando momentos do passado com antepassados já falecidos, não se pode ser saudosista, sob pena de não se aproveitar o momento presente etc. Nunca fora saudosista quando mais jovem. Depois dos 50, passei a ser. Sinto-me bem, relembrando fatos e imagens do que aconteceu. Consigo me lembrar de cada objeto que recebi de lembrança, principalmente de alunos e amigos, de cada foto que manuseio, onde foi tirada, quando foi, com quem eu estava. Faz muito bem, ainda, poder me lembrar. Penso que logo não me lembrarei mais, por isso escrever é tão significativo.
Só tem lembranças quem viveu aqueles momentos. Chico Buarque diz “Os momentos bons e as horas más / que a memória coa …” é uma imagem precisa: só terá sentido o que a memória coou, reteve, manteve …
Quantos instantes preciosos em nós- mesmo os que vivemos só nós mesmos, sem contá-los a ninguém- fazem valer uma existência: quando na infância recebemos um presente, uma presença, um gosto, um perfume, um toque… tudo da infância precisa ficar registrado, primeiro em nós, depois para os que virão depois de nós e o narrarão aos que virão depois deles. É a história sendo vivida, cotidianamente.
Tenho saudade de meus pais, já não consigo mais ouvir a voz de minha mãe; a de meu pai só em DVD que vejo, vejo pra olhar pra ele, ouvi-lo, fechar meus olhos … como se ele estivesse sorrindo, ainda aqui.
Tenho saudades de minhas ingenuidades e credulidades juvenis. Eram elas que mantinham erguidas minhas esperanças, de toda ordem: as pessoais, as profissionais, as políticas e sociais, as sentimentais… gosto de me lembrar de como fui. Sinto saudades daquela que fui.
Tenho saudades dos meus amores, que sempre os amei em verso e prosa. O romantismo das histórias lidas em meus clássicos, as poesias demoradamente degustadas, as músicas que ouvi, desde garota na Rádio JB no Rio; depois, as da Eldorado em São Paulo, não existia FM ainda…. todas elas decalcaram minha vida, aos poucos.
Tenho saudade da leitura diária dos jornais, no Rio, quando menina; em São Paulo, quando universitária. Tenho saudade dos shows gratuitos a que compareci, principalmente os de MPB, nos anos 80, naquela cidade. As peças de teatro, as mostras de arte e cinema, quantas fizeram de mim o que sou… o cinema, tantas vezes na sessão da meia-noite, pré-estreias famosas ou outras, com diretores e atores participando dos debates.
Quanta saudade tenho dos comícios de que participei na Praça da Sé, com minha filha ainda em um canguru, amarrada a mim, mas junto, ali, presente.
Tenho saudade dos meus arroubos amorosos todos: jardins feitos com as próprias mãos, repletos de amores-perfeitos, faixas e cartazes pela casa inteira, coletânea de versos, jantares e afins em domicílio pra pintar os céus de lirismo. Tenho saudade de quem eu fui.
Tenho saudade do sentimento que me invadia quando de festas de aniversário surpresa, presentes feitos por alunos, flores recebidas, demonstrações de afetividade de quem quer que fosse.
Tenho enorme saudade do momento em que, por duas vezes fui mãe, de quando ouvi meus filhos me avisarem “chegamos, mãe” e os amamentei por meses e meses. Tenho saudade de suas tosses, de suas febres, dos carinhos sublimes em mim. Tenho saudade da sensação de ouvi-los falar as primeiras palavrinhas e de quando conseguiram andar. Tenho saudade daquelas sensações todas. Tenho porque as saboreei da fruta ao caroço, como as mangas de que tanto gosto. Todos esses sabores ainda os tenho em mim.
Tenho saudade de uma outra que eu era, de uma outra que acreditava muito em amanhãs. Hoje não posso mais ser assim. Chego a me admirar da felicidade miúda que vejo em pessoas que desejam muito pouco da vida – a maioria delas por alienação política, social ou até por certa escolha. Não posso ser assim, porque minha história de vida não me fez nem me faz assim.
Tenho saudades sim, gosto de ver fotografias e de lembrar quem fui e quem sou.
“A vida é um sopro”. Escrevo enquanto consigo lembrar.
Apresentação da Orquestra Ouro Preto em concerto especial com músicas dos Beatles. Gravado na Casa da Ópera Teatro Municipal de Ouro Preto no dia 21 de dezembro de 2010. Regência do Maestro Rodrigo Toffolo, arranjos de Mateus Freire.
DURANTE OS ANOS DE 2014, 2015 e 2016, as crianças e pré-adolescentes do Clubinho da leitura viveram ações de integração com a comunidade. Algumas delas usufruindo de experiências e de equipamentos culturais e outras vezes cumprindo a tarefa de divulgação da importância da leitura e das diversas linguagens culturais pelo bairro do Carmo, em Barbacena, Minas Gerais.
Em abril de 2014, poucos meses após o início das atividades do Clubinho da leitura, fizemos uma apresentação para os pais, em um lindo sábado de sol. Nesse dia eram as crianças que explicavam o que afinal era um Clubinho da leitura, por que recebera o nome de “Plácido José de Oliveira”, que ações eram desenvolvidas ali – para isso declamaram poesias com seus pais, fizeram história oral coletiva com o bonequinho verde, o Mineirinho, vestiram-se e desfilaram com suas fantasias, leram histórias para os convidados … Fiquei quase calada, porque eram eles os mestres de cerimônia naquela tarde.
Em agosto de 2015, fomos juntos ao teatro na ESTAÇÃO PONTO DE PARTIDA, assistir ao espetáculo de marionetes MUSICIRCUS, da Cia. Navegante. Nunca haviam ido a um teatro.
PRODUZINDO TEXTOS DE AGRADECIMENTO POR DOAÇÕES DE LIVROS VINDAS DO RJ, SP, MG
Canal: Estrela Leminski
ALGUMAS VEZES FOMOS AO CINEMA NO SHOPPING ASSISTIR A FILMES, ANDAR NA ESCADA ROLANTE E VER VITRINES TAMBÉM
DIVULGANDO O CLUBINHO DA LEITURA NO POSTO DE SAÚDE DO BAIRRO. DISTRIBUIÇÃO DE FILIPETAS E EXPLICAÇÕES: “É de graça, viu “.
FIZEMOS UMA CAMPANHA PELAS CASAS E PELAS LOJAS COMERCIAIS DIVULGANDO OS LIVROS QUE CADA UM HAVIA MAIS GOSTADO DE LER E O PORQUÊ
Levamos os livros e bandeirolas de publicidade de cada livro feitas por eles mesmos
FOMOS AO CIRCO
FOMOS À “VIVENDA DOS OLIVEIRA”- nosso Clubinho de campo
LEVAMOS CONVIDADOS PARA DECLAMAÇÃO DE POESIAS NA FESTA DAS CRIANÇAS
Da vez primeira, a alegria
Do choro vivo, a força da existência
Dos belos lábios, a contemplação
Do choro grave, a música ansiada
Dos primeiros passos,o deslumbramento
Das primeiras palavras às frases especiais,
a perplexidade,
o encantamento,
o orgulho.
De bebê a menino, a sensibilidade
à flor da pele, do nariz,da boca.
A escrita da letra, da palavra, da voz.
O gosto da Ciência, a cor da Música,
tudo junto, tudo forte, tudo assim.
Vendo e sentindo
Vendo e pensando
Vendo e sofrendo
Vendo e sorrindo.
A dor nas mudanças,
a dor nos riscos.
Você, especialmente,
Você …
PEDRO
Filho, fruto da minha ânsia de amar, de ser mãe de menino-homem. Quem poderia imaginar que seria assim tão diferenciado …
Pregam que devemos dizer a quem amamos que o amamos antes que seja tarde ou nunca seja.
Companheiro desde os primeiros instantes quando chorou de dentro para fora de mim, quando varado de fome, voraz, em poucas horas sugou o colostro que o protegeria de todas as infecções primeiras.Sempre voraz em acalanto, me aprazerava com seu sorrisinho suave quando cuidava de mim, fingindo ser eu quem cuidava dele.
Afetuoso sempre, suave e fraterno com amigos, com os mais velhos – seus preferidos, aliás. Sem tolerar palavras duras e brigas, fossem de quem fossem. Sensível, parceiro, amigo.
Quantas vezes me ensinou a ler. Ao ouvir o poema de Drummond, aos 5 anos, enquanto eu dirigia na volta da escola, me revelou que a pedra no caminho era como uma fase dos jogos do Nintendo, quando se vencia uma fase logo vinha outra a ser vencida e que tinha entendido o que o poeta falara.Como não me lembrar disso ?!
Quantas vezes suportou com muita paciência minhas conversas de trabalho, mesmo sem alcançar a dimensão das queixas que eu fazia ou as injustiças das quais eu reclamava. Ao contrário, adorava me ouvir contar dos projetos que realizava com meus alunos- e muitas e muitas vezes me acompanhou em atividades extra-classe, em concertos de música erudita, em espetáculos de dança, ao teatro, aos museus …
Quantas vezes foi meu parceiro em mudanças e arrumações- diga-se de passagem sem gostar muito, pois prefere o estabelecido, sem arrastar móveis e encaixotar o já vivido.
Quantas vezes acompanhou novelas de época, minisséries, shows ao meu lado, fisica e efetivamente junto.
Muito responsável em menino, menos exigente consigo mesmo quando adolescente, sempre lendo, informando-se, crítico, reflexivo, completamente puro e ingênuo para as rasteiras que a vida oferece a todo instante, seja no terreno emocional, pessoal, profissional… a vida vai ensinando -muito mais do que eu, que sou aprendiz em grau bem mais fundamental que o de Pedro.
Fazer escolhas pessoais, fazer escolhas profissionais, responder por elas, mestre de intuição e sensibilidade, meu filho é senhor. Respeitador de mulheres, consciente do que busca e valoriza, segue.
Independente de mim, é preciso ir.
Nada consegue me fazer esquecer meu eterno cúmplice.
Quando estico um lençol na cama, quando ponho a mesa, quando penduro roupas no varal, quando arrasto um móvel, quando o computador me pede que o desvende… quando, quando… meu Pedro engrossa cada lágrima de saudade em mim. E como não ser assim ?
Revejo fotos de meu bebê, de meu menino, de meu rapaz, do homem que se tornou hoje… e me fortaleço muito.
Na vida o que deixamos como herança é o que fica. Pedro (e Carla também) não terá nada mais do que aquilo que vivemos juntos. É o bastante.
Admiro aqueles que inspiram versos, melodias, arte em geral. Ser musa inspiradora é uma bênção. Saber-se razão e emoção para a criação é algo inestimável. Muitos poetas beberam lirismo em suas musas e assim foi Paulo César Pinheiro, em relação à Clara Nunes.
Conheci uma escritora em São Paulo que, já estando separada do marido, enviou-lhe por correio em um pacote bonito, envelope grande, os originais de seu livro de poemas, grande parte deles escritos enquanto viveram casados, por muitos anos. Havia ali uma linda dedicatória ao homem amado, fonte daquela produção de versos em cascata e guardados, por anos, com ela. Contou-me que ele sequer abrira o envelope, devolveu-o pelo correio, escrevendo por dentro “outras postagens serão incineradas”. Fiquei estarrecida com a narrativa dela. O livro foi publicado, é claro, mas com outra dedicatória. Muita insensibilidade, muito medo de ter que responder por um sentimento inequívoco vivido por ambos.
Outra amiga da Granja Viana contava que se apaixonou por um homem, homem rústico, pouco apreciador de versos, literatura, arte. Bebedor de pagodes paulistanos e engolidor de garrafas de cerveja transformava-se num dançarino de primeira, risonho, falastrão, gargalhador. Fascinou-a isso. Como professora que era, ela adorava cinema, arte, literatura. Passados uns meses, talvez um ano, não me recordo- romperam sem explicações plausíveis. O homem, hoje já falecido até, não atendia ligações dela, numa época em que poucos tinham detector de chamadas, nem existiam celulares. Passou a fugir de minha amiga, por medo de envolvimento, como um gato escaldado.
Na verdade, ela queria transformar o sentimento, de forma natural, sem marcas e mágoas. Telefonar-lhe em aniversários, datas comemorativas, congratular-se com ele. Não compreendeu nada e, muito grosseirão, passou a tratá-la como uma daquelas mulheres mais vulgares a que ele estava acostumado.
Uma prima minha me conta que presenteou um namorado, na década de 80,com dois lindos livros raros, que o rapaz dizia um dia querer comprá-los etc. Tempos depois, quando ela os achou, fez um pacote, sem nada de declarações amorosas, enviou-os pelo correio ao moço, quando ele já vivia no Rio de Janeiro. Assustada, ouço que ele havia devolvido o pacote, dentro de outro envelope, sem sequer saber do que se tratava. Prova inequívoca de desprezo, humilhação e medo do que poderia haver ali. Um horror.
Fico me perguntando que medo é esse que grande parte dos homens têm de nutrir outros sentimentos por mulheres, que não sejam apenas os baseados no amor físico. Parece que não sabem lidar com isso. Talvez por certa onipotência masculina, talvez por absoluta necessidade de comando, talvez por vaidade, talvez por medo de não encontrar e não saber onde guardar sentimentos antigos, sem aquecê-los, e por isso evitam vivê-los.
Há sim amizade entre homens e mulheres. Há sim admiração entre homens e mulheres. Há sim sentimentos de maturidade entre homens e mulheres, que podem existir sem amor físico ou mesmo após este ter existido. É preciso aprender a transformar, a reciclar sensações. Não somos seres primitivos que se mantém apenas nutridos por instintos básicos. Somos seres sensíveis, delicados, frágeis também. É preciso reconhecer, admitir isso. Agressividades gratuitas, humilhações cotidianas revelam, na maioria das vezes, fraqueza moral e, sobretudo, grande imaturidade. O que é mais “simples” é mais fácil. Sempre.
Dedicatória: A todas as mulheres e à sua sensibilidade natural.