Corro pra visitar aquelas cachoeiras nunca tocadas
corro para beber água gelada de serras amanhecidas
corro para falar “eu te amos” aos que nunca o ouviram de mim
corro para cozinhar delícias e, em comunhão, ofertar aos queridos aliados
corro para beber sabores que nunca experimentei por impossibilidades várias
corro para escrever letras, sílabas e linhas anoitecidas,
enquanto ainda consigo
andar
ver
falar
ler
respirar
me encantar.
TERRA DE MINAS
Que bondade tem o garoto mineiro que ajuda a carregar embrulhos, mesmo sem precisão…
Que prosaico é aquele “cê bobo” ao final das frases coloquiais …
Que vontade é essa de ficar sentado na praça a tocar causos e prosas até o entardecer…
Que permissivo é esse tom de confidência de quem jamais nos viu antes …
Que adocicado é esse olhar de matutagem espalhado pelas calçadas …
Que coisa caseira é essa que me enternece de água os olhos …
Talvez seja encontro de sangue mineiro com sangue mineiro.
Talvez seja um ponto de vista repleto de montanhas .
Talvez seja essa vontade de encontrar o que uma vez se perdeu em mim.
FESTA NA ROÇA
O céu dormiu chovendo
acordou sorrindo.
Dia de festa na roça.
Café adoçado com rapadura.
Quitandas em potes
Bolo de milho, bolo de mandioca, doce de leite, queijo de casa.
Linguiças penduradas tinindo de frescas.
Um anguzinho mole, sem sal
pra ser comido com leite
” Dona Neuma me traz frango. E o quiabo fresquinho da horta, hem.”
Ouvem-se vozes ao longe.
Ouvem-se conversas de décadas, relembradas,
do primo de uns, dos tios de outros, da madrinha deles todos.
Quem morreu na semana passada? Quem casou? Quem nasceu?
Uns trazem as encomendas, outros trazem os braços e as mãos pra arrumação
Outros trazem as palavras na voz a um aconselhamento .
Risos doces e salgados de dança mineira no chão.
CIDADE
Respirando o mesmo ar,
ouvindo o mesmo apito de trens
vendo escurecer as mesmas subidas e descidas
um desencontro de séculos.
Descaminhos de aço e flores.
Descaminhos de álcool e aromas
Descaminhos de dez caminhos sinuosos
Amanheceu
Entardeceu
Anoiteceu
Beija-flores e bem-te-vis
cumprimentaram maritacas e melros
Sanhaços beliscaram uns frescos sumos.
Recolheram-se no cedro em frente.
Encontros, desencontros, impedimentos, desmandos.
Sinas e sanhas, sagas e desdouros.
Mesmo ar
Mesmo céu
Mesmos trens …
Post dedicado aos meus companheiros de viagens Angélica e Jucélio- dois seres humanos que me emprestam pernas, braços, risos e colorido, em momentos em que eu nem sabia que havia. Obrigada, meus queridos, muito obrigada.
Sobre os cancionistas, recomendo a obra de meu ex-colega de turma, na USP, Luiz Tatit: “O cancionista: composição de canções no Brasil”
Estudo da obra de onze entre os principais compositores populares brasileiros – Noel Rosa, Lamartine Babo, Ary Barroso, Dorival Caymmi, Lupicínio Rodrigues, Luiz Gonzaga, Tom Jobim, Roberto Carlos
Temos acompanhado emoções à distância, cursos à distância, shows à distância …
Talvez não estivéssemos preparados para bons-dias, boas-tardes e boas-noites à distância. Fomos acostumados a olhar nos olhos uns dos outros, a sentir-lhes as emoções, e de todos os tipos.
A solidão das cidades mergulhou uma grande parte das pessoas em redes artificiais de contato, de afeto; conta-se tudo, ensina-se tudo, mostram-se todas as fotos de todos os lugares onde se esteve e até o mapa do local onde se está naquele exato instante.
Há de se convir que é estranho. Não emito juízo de valor ou crítica a isso, apenas constato que é estranho. Tornou-se muito diferente o estado de intimidade entre as pessoas… a ponto de não se ouvir nem mais a voz de seu interlocutor, escreve-se, mandam-se mensagens escritas, imagens, músicas, emoticons etc. etc. Alguns há que se incomodam até com chamadas telefônicas, não atendendo-as, por nada, mais.
Não sei onde estão as ânimas das pessoas. Tudo é um jogo virtual apenas. Não se pode fiar mais no que se lê, se vê e até no que se ouve nas telas.
Tempos difíceis demais de serem compreendidos por muitos de nós. Grandes enigmas aparecem por essa razão. Muitas confusões, diatribes e melancolias resultam desse estranho e novo jeito de ser. Nunca se saberá com quem se estará lidando. Talvez tudo faça parte de um jogo- novo também- onde se vivam papeis pré-estabelecidos, sem possibilidade de alteração: antagonistas sempre antagonistas, protagonistas sempre protagonistas, sem possibilidades de inversão desses papeis, de rotação , como geralmente ocorre no mundo real. A visão maniqueísta gera um cansaço a quem participa desses círculos virtuais, dessas redes sociais … Tudo é relativo, tudo é virtual, tudo é de brincadeira apenas.
Pode parecer bom não se responsabilizar por nada, não ter seus nomes revelados, seus locais de ação revelados…. esse anonimato conveniente é confortável e dissemina ainda mais a omissão, a desfaçatez e a falta de responsabilidade por palavras e atitudes. Tudo muito confortável.
Quem não sabe jogar não desce pro play– já li por aí.
Deve ser verdade.
Prefiro jogar à vera, contudo.
OUVINDO APENAS: DE PREFERÊNCIA DE OLHOS BEM FECHADOS OU BEM ABERTOS
Texto e poesias: Odonir Oliveira
Imagem: Páris e Helena , Jacques-Louis David (França, 1748 – 1825)
Música: “Wind Marching For Rain”, Puddle of Infinity
Imagens: Black /White/ Wood – Pinterest //Mel Melissa Maurer – Instantes fotos ao álbum “NUde”
RAÍZES DE HOMENS
Há certos homens que têm caules vigorosos.
São eles que semeiam a terra
afagam sementes
exalam perfumes de flores
recolhem os frutos doces.
Há certos homens que encostam as mãos na terra
a fortificam com seus dedos ásperos
a revolvem com palmas ardentes
a fertilizam com braços seguros.
Há certos homens que têm raízes em lugar de pés,
fincam-se inexoravelmente.
When I get older losing my hair, Many years from now. Will you still be sending me a Valentine. Birthday greetings bottle of wine. If I’d been out till quarter to three. Would you lock the door. Will you still need me, will you still feed me, When i’m sixty-four.
You’ll be older too, And if you say the word, I could stay with you.
I could be handy, mending a fuse When your lights have gone. You can knit a sweater by the fireside Sunday morning go for a ride, Doing the garden, digging the weeds, Who could ask for more? Will you still need me, will you still feed me When I’m sixty-four.
Every summer we can rent a cottage, In the Isle of Wight, if it’s not too dear We shall scrimp and save Grandchildren on your knee Vera, Chuck and Dave
Send me a postcard, drop me a line, Stating point of view Indicate precisely what you mean to say Yours sincerely wasting away Give me your answer, fill in a form Mine for evermore Will you still need me, will you still feed me When I’m sixty-four?
Quando eu estiver com sessenta e quatro
Quando eu ficar mais velho, perdendo meus cabelos
Muitos anos adiante
Você ainda irá me mandar presentes no dia dos namorados
Saudações no aniversário, garrafa de vinho?
Se eu estiver fora até quinze pras três
Irá trancar a porta?
Você ainda irá precisar de mim, ainda irá me alimentar
Quando eu estiver com sessenta e quatro
Você estará mais velha também
E se você disser a palavra
Eu poderia ficar com você
Eu posso ser útil, consertando um fusível
Quando suas luzes apagarem
Você poderia me tricotar um suéter perto da lareira
Nas manhãs de domingo iremos dar uma volta
Fazendo o jardim, cavando a erva daninha
Quem poderia pedir por mais
Você ainda irá precisar de mim, ainda irá me alimentar
Quando eu estiver com sessenta e quatro
Todo verão poderíamos alugar uma cabana
Na Ilha de Wight, se não for caro demais querida
Iríamos pechinchar e economizar
Netos no joelho
Vera, Chuck & Dave
Mande-me um cartão postal, me mande um telegrama
Informando o ponto de vista
Indique precisamente o que quer dizer
Este que te pertence e que está se esvanecendo
Me dê uma resposta, preencha um formulário
Minha para todo o sempre
Você ainda irá precisar de mim, ainda irá me alimentar
Quando eu estiver com sessenta e quatro ?
Poemas escritos no calor das emoções, com todo o meu amor, aos meus queridos e inesquecíveis amigos de infância e adolescência da F.N.M.lembrando que SOMOS JOVENS !