Minha terra

Cecília é o caso de poesia total. Cecília é o próprio nome da poesia. Riqueza verbal e espiritual. E nobre por fora e por dentro. Não participa nunca das coisas menos elevadas. Não tem deficiências. E poesia no sentido universal. Tem coisas que não se encontram em nenhum outro.”
Carlos Drummond de Andrade, em “Pedro Bloch entrevista”. (Grandes Entrevistas Manchete). BLOCH, P.. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1989.

A arte de ser feliz

Houve um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa, e sentia-me completamente feliz.

Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém minha alma ficava completamente feliz.

Houve um tempo em que a minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava história. Eu não a podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que ouvisse, não entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, e às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu que não participava do auditório imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz.

Houve um tempo em que a minha janela se abria para uma cidade que parecida feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde e, em silêncio ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros, e meu coração ficava completamente feliz.

Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar. Marimbondos: que sempre parecem personagens de Lope da Vega. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu me sinto completamente feliz.

Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outras dizem que essas coisas só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

Em: Escolha o seu sonho, de Cecília Meireles. 4ª ed., Rio de Janeiro: Global Editora, 2016.

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Instituto Piano Brasileiro

Amor, amores

Por quase 7 décadas venho sentindo, observando, avaliando, refletindo, sentindo, vivendo, intuindo, analisando, perscrutando, investigando, auscultando, sentindo, fotografando, filosofando, conhecendo… sentindo o Amor. Só sei que ainda conheço pouco sobre as formas de Amor. Talvez porque os seres humanos sejam também difíceis de serem conhecidos. Todavia, com a passagem das décadas, é fatal que se venha a conhecer mais do Amor, do que quando o sentimos nas primeiras vezes. O Amor é vital aos seres humanos.

Poesias: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeos: Canal Odonir Oliveira

Poema só

Poema só para Jaime Ovalle

Quando hoje acordei, ainda fazia escuro
(Embora a manhã já estivesse avançada).
Chovia.
Chovia uma triste chuva de resignação
Como contraste e consolo ao calor tempestuoso da noite.
Então me levantei,
Bebi o café que eu mesmo preparei,
Depois me deitei novamente, acendi um cigarro e fiquei pensando…
– Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.

BANDEIRA, Manuel. “Belo belo”. In:_____. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1967.

Poesia: Odonir Oliveira

Vídeos:

1- Canal Instituto Piano Brasileiro

2- Canal Odonir Oliveira

Bituca, o mais mineiro dos cariocas: 80 anos

Odonir Oliveira

(há 5 meses) Bendito Bituca, que os céus se encantem com seus mil tons de lirismo, com suas vozes em todas as variantes com que nos brindou. Olhe o céu agora. Repare nas notas musicais escritas nas nuvens, entrecortadas pelo arco-íris. Bendito Bituca!

Bituca, obrigada por cantar as ESPERANÇAS

Canal Milton Nascimento

Milton, obrigada por cantar a AMIZADE

Canal Paula Marques

Milton, muito obrigada por LOUVAR AS MULHERES

Canal Milton Nascimento

Milton, muito obrigada por cantar o BRASIL

Canal Milton Nascimento

Milton, muito obrigada por cantar Minas

Canal Acervo da Música Brasileira

Bituca, muito obrigada por nos contar a nossa própria História

Canal Milton Nascimento

Bituca, obrigada por cantar o AMOR

BITUCA, UM PÁSSARO NEGRO
olhar tímido
corpo franzino
jeito matreiro, moleque
é menino
lirismo nas veias
acordeon nos braços
amor de mãe
amor de pai
cenários de Minas
minas de ouro nas veias
garganta de rapaz
bailes de serenatas
gravatinha borboleta
sabiás e canários na boca
versos nos lábios
enche os dias
enche as rádios
enche os estádios
enche nossas vidas
Ajoelho-me ao menino carioca,
ao mais mineiro de todos os cariocas.
Que felicidade ter sido sua contemporânea, Bituca!

Canal Odonir Oliveira

Poesia: Odonir Oliveira

Foto retirada da Internet

Pais & Filhos

Na década de 1970, eu ainda não era MÃE, mas já era PROFESSORA e li O Profeta, de Gibran Khalil Gibran; marquei as páginas de que mais gostei. As minhas favoritas eram sobre o AMOR e sobre os FILHOS. Jamais esqueci o que li, aprendi, reli e continuo relendo nesse livro.

Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,
Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável.

Imagens retiradas da Internet: Super-Mãe, de Ziraldo

Vídeo: Canal acumpuctura

O Ziraldo que conheci

“Zi, de Zizinha e raldo, de Geraldo, prazer em te conhecer”
Foi assim que conheci Ziraldo, em 1988, no stand da Editora Melhoramentos, na BIENAL DO LIVRO, em SP. Eu estava acompanhada de uma quantidade de alunos da Escola Estadual da Aldeia de Carapicuíba, São Paulo. Ele foi muito afetivo com meus meninos pobres, autografou livros e pediu que eles autografassem os deles para ele levar consigo. Eram exemplares de “Flicts e seus amigos”, uma resposta ao dele, ao 1º livro dele, FLICTS, “Só que a gente fizemos um livro mais alegre, acho que ele deve ter gostado, né”– falou um dos meninos.
O vídeo abaixo traz o registro do trabalho com essas crianças.
Ziraldo me contou nesse dia que estavam saindo “do forno” histórias em quadrinhos, mais baratas para que todas as crianças pudessem ler, visto que livros, em geral, eram caros para muitas crianças. Nós adoramos a ideia.
Anos mais tarde, me tornei leitora crítica do segmento de literatura infanto-juvenil da Editora Melhoramentos. A editora era Leila Bortolazzi (que ainda é) e conhecia meu trabalho. Fui a eventos de lançamentos lá com ele e pude vê-lo bem de pertinho em pequenas rodas de aproximação.
Mais tarde, quando lançou a A Vovó Maluquinha, A Professora Maluquinha e a Coleção Bichinho da Maçã, estive presente.
Frases de Ziraldo; “LER É MAIS IMPORTANTE QUE ESTUDAR”, provocando a incompreensão de uma leva de professores. Eu assinava embaixo, usava até um botton com ela. Entendia, como ele, que o ensino regular, normativo e apenas reprodutor não era mais importante do que a LEITURA; ela sim, livre, variada, encantada… que ensina a criar, a desabrochar, a aprender.
Em fins dos anos de 1990, criou a revista Bundas e cunhou o bordão “QUEM MOSTROU A BUNDA NA CARAS NÃO VAI QUERER MOSTRAR A CARA EM BUNDAS”. Era frasista como seu amigo Millôr Fernandes. Eu sempre adorei a irreverência de ambos. Desde os tempos de O Pasquim, no Rio.
Guardo dele muitas e muitas lembranças, e livros autografados.
No último fim de semana assisti por 2 vezes ao filme dirigido por sua filha Fabrizia Pinto, no Canal Curta, “Ziraldo, era uma vez um menino”, e me emocionei muito.
Ziraldo completou 90 anos e, mesmo debilitado por seguidos AVCs, ainda gravou vídeo em 2018 contra a ameaça que viria a acontecer ao nosso país. Estava certo.
Antes de aprender a ler, minha filha aprendeu FLICTS, em 1985. Eu, junto com ela.
Tenho imagens maravilhosas com seus livros em mim.

1988

Texto: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Odonir Oliveira (a partir de gravação da TV Cultura)

Não apresse o rio (ele corre sozinho)

Em 1979, li “Não apresse o rio (ele corre sozinho), de Barry Stevens. “Este livro é um relato, na primeira pessoa, a respeito do uso que a autora faz de Gestalt-terapia e dos caminhos do Zen, Krishnaumurti e índios americanos para aprofundar e expandir a experiência pessoal e o trabalho através das dificuldades. “ Temos que nos colocar de cabeça para baixo e inverter nossa maneira de abordar a vida. “ Este episódio autobiográfico mostra a autora nesse processo, em 1969, durante um período de três meses em contato com Fritz Perls, no Instituto Gestalt do Canadá.”

Poesias: Odonir Oliveira

Foto de arquivo pessoal

Vídeos: Canal Odonir Oliveira

“Toda vez que o adulto balança”

BOLA DE MEIA, BOLA DE GUDE

Há um menino, há um moleque
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança ele vem pra me dar a mão
Há um passado no meu presente
O sol bem quente lá no meu quintal
Toda vez que a bruxa me assombra o menino me dá a mão
E me fala de coisas bonitas
Que eu acredito que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor
Pois não posso, não devo
Não quero viver como toda essa gente insiste em viver
Não posso aceitar sossegado
Qualquer sacanagem ser coisa normal

Há um menino, há um moleque
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança ele vem pra me dar a mão
Há um passado no meu presente
O sol bem quente lá no meu quintal
Toda vez que a bruxa me assombra o menino me dá a mão
E me fala de coisas bonitas que eu acredito
Que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor
Pois não posso, não devo
Não quero viver como toda essa gente insiste em viver
E não posso aceitar sossegado qualquer sacanagem
Ser coisa normal
Bola de meia
Bola de gude
O solidário não quer solidão
Toda vez que a tristeza me alcança um menino me dá a mão
Há um menino, há um moleque morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto fraqueja ele vem pra me dar a mão

Compositores: Milton Silva Campos Do Nascimento / Fernando Rocha Brant

Boldrin dizendo Guimarães Rosa

Fotos de arquivo pessoal

Vídeos:

1- Canal Antônio César

2- Canal TV Cultura