Nenhuma poesia

HORA DE IR

Profundamente
hora de ir
tristeza tatuada eterna
os laços se soltam
sem voltas
o fraterno
mais novo
vai nas nuvens
vai no éter
tão moço ainda
vai.
300 dias passam
os laços se soltam
sem voltas
o fraterno
mais velho
se debate em finitude
coração em compasso frágil
ritmo lento
desrumos
tropeções
pedras intransponíveis
os laços se soltam
o homem sem rosto
leva a moça linda nas mãos
beija a moça
lambe a moça
come a moça
saboreia a moça
ela conta
ela canta
ela aponta
ela fotografa
ela desdenha sentires e ficares uns
tristeza absoluta
luta
bruta
constante
fraqueza nos nervos
torpeza das hipocrisias de trilhas e rotas
sumidouro de sentidos verdadeiros
mentiras
desfalques nas certezas
saques em alternativas possíveis
falsidades depositadas
lances de lambe-lambes
fartamente recorrentes
a vileza da moça
flores nas mãos do homem
antecipando
justificando
amenizando
a fuga seguinte
a corda
a forca
a chegada
Hora de ir
nada mais importa
tristeza profunda
descrença em qualquer ato humano
cabotinismos fortuitos
carpe diem tardios
nulidades hipervalorizadas

Profundamente.

Poesia: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal jane8948

Dias dos namorados VII

CAVALGA-ME

vem e me toma
vem e me bebe
vem e me atravessa
vem e penetra meus ombros
vem e penetra minhas sombras
cavalga-me
vem e penetra meus caminhos
vem e penetra meus risos e gargalhadas
vem e penetra meu colo meu umbigo
cavalga-me
vem e penetra meus gritos de dor
vem e penetra minhas madrugadas
vem e penetra meus sonhos
cavalga-me
vem e penetra meu amanhecer
vem e penetra minha estrada
vem e penetra-me nas estradas
cavalga-me
vem e penetra em meus rios
vem e penetra-me nas estrelas
vem e penetra-me nas nuvens
acorda
levanta
vem
cavalga-me de luz

UM POEMA DE AMOR

Ah, que demorem essas noites a chegar,
que fiquem as tardes, congeladas, com o ardor de seus beijos,
que permaneçam em meu dorso seus toques firmes
que em meus ouvidos cristalizem-se suas palavras todas
que seu rosto, como um som, repercuta em meu colo
que suas mãos cálidas entorpeçam minha voz incapaz
que seus pés se sobreponham aos meus como se me sustentassem a alma
que seus braços me envolvam com ternura e firmeza como um laço
que sua boca nada mais diga a não ser sussurros e apelos de ais
que seus olhos se fechem a apenas enxergar sabor em mim
que seus encantos estrangeiros e únicos não se percam com o escurecer
que sua língua armazene senhas de contato insubstituíveis
que seus dedos deslizem como seda no percurso de mim
que suas delicadas e sensíveis marcas se descubram por mim
que eu possa escurecer, com você, à chegada da primeira estrela.

SIM

Sim, porque “eu te amo”
Sim, porque eu te amo, dei pra gostar de músicas de amor, outra vez;
Sim, porque eu te amo, dei pra gostar de cartas de amor, ora em nuvem;
Sim, porque eu te amo, dei pra conversar com as flores, os pássaros, os bichos que percorrem os caminhos;
Sim, porque eu te amo, dei pra recordar sorrisos e alegrias e piadas tolinhas outrora ouvidas;
Sim, porque eu te amo, dei pra adorar vegetais, verduras, pratos coloridos em geral;
Sim, porque eu te amo, voltei a ver os filmes que já vi, os que nunca vi e desejar fazer outros tantos;
Sim, porque eu te amo, encontro gente que me sorri adivinhando meu estado de constante prenhez amorosa;
Sim, porque eu te amo, fico a namorar a chuva pela janela, a ver escorrer enxurradas de barquinhos invisíveis …
Sim, porque eu te amo, abro sorrisos largos, antes desconhecidos;
Sim, porque eu te amo, dei pra dormir menos e viver mais;
Sim, porque eu te amo, passei a fertilizar a terra, a polvilhar nela sementes de abacateiros, ameixeiras, limoeiros, passiflora ardente;
Sim, porque eu te amo, espero o entardecer, o sol se por e o dia raiar de novo a suspirar;
Sim, porque eu te amo, dei pra aceitar mais as diferenças entre as pessoas, o percurso de cada uma, a beleza das animas;
Sim, porque eu te amo, encontro nas montanhas companhia solene para a reflexão, o assobiar dos bem-te-vis e a oratória das maritacas;
Sim, porque eu te amo, abro mão da cotidiana cobrança do ser e estar, do compulsório e eterno ressarcimento de tempo e espaço;
Sim, porque eu te amo entrego, em pacotes, manifestações de afeto e alegria como mínima retribuição pelos sonhos sonhados;
Sim, porque eu te amo, entorno rios de lágrimas pela insegurança do meu amor e não do teu;
Sim, porque eu te amo, não me permito ser mais frágil como antes o fui e não polir esse último e único brilhante;
Sim, porque eu te amo, contraio vontades inusitadas de dirigir por estradas a esmo, easyridermente;
Sim, porque eu te amo, aguardo o sono e os sonhos em que símbolos e sons compartilharão sensações indefinidas, irracionais, incompreensivelmente deleitáveis;
Sim, porque eu te amo, conheço espaços nunca antes percorridos, sabores nunca antes encontrados, sensações nunca antes experimentadas;
Sim, porque eu te amo, sei que estás no todo do meu caminhar e descubro que és a outra parte de mim em mim.
Sim porque eu te amo.


ARDE A TARDE

esteve sempre ali
esteve sempre silente
com mãos vivas e pele quente
esteve sempre ali
esteve sempre no verde
com pernas maduras e pés ardentes
esteve sempre ali
com grutas incandescentes e acalentadoras
esteve sempre ali
esteve sempre no verde
nunca musa, esfinge, vestal
esteve sempre ali

GARRAFAS AO MAR

Atiro garrafas ao mar
para que as encontre
vazias de mensagens
e as faça retornar
repletas de significados
com códigos secretos,
com nossas senhas de identidades
descobertas,
e deliciadas,
continuadamente..
Atiro garrafas ao mar
para que ao encontrá-las as sorva
inteiras
salgadas
dionisiacamente
e, com um sopro dos ventos,
as devolva a mim
por marés transbordantes de prazeres.

Atiro garrafas ao mar
para recebê-las ainda
com as marcas de sua boca,
de suas mãos
e de seus desejos contidos
ali
aqui
acolá.

SANGUE

pulsando lateja
correndo percorre
fervendo explode
muitas vezes
muitas vezes
muitas vezes
ele e eu
eu e ele
ele e eu
eu e ele
veias dilatadas pulsando
veias quentes gritando
veias dele sobre
veias dela sobre
transfusão
transfiguração
rios vermelhos
tempestades vermelhas
sem afluentes
desaguando num mar

SORRISO DE ESTRELA

É quando no desespero de mim,
que encontro a ti
sorrindo repetidas vezes
com passos ouvidos
em reflexos mínimos
em espaços imprevisíveis
em momentos inesperados.

É quando miro estrelas
que encontro
teu lume no delas
tua silhueta na delas
teu dorso incomum no brilho delas.

É quando escurece
que estrelas em ramalhetes
te trazem a mim,
e em ti permaneço
pousada no céu.

POENTE II

Todos correm
Apressados
A dança se inicia
Onde estaria meu par?
Passos apressados
Ritmo acelerado
Que desse lado já dançam !
São muitos os pares.
Ajeito a boca
Com batom vermelho da cor do poente
Arrumo os cabelos curtos
Mas embaralhados
Por aquelas emoções.
Procuro
Procuro
Onde estaria meu par?
Apresso a coreografia
Antes que ele se perca de mim.
Apresso
Apresso
Vislumbro-o ao longe, que longe!
Do outro lado do lago.
De lá, comigo não poderá dançar.
Aceno
Aceno
Ele me entende
e atravessa,
também ele,
coreografando passos,
o lago.
Agora sim ,
aqui perto,
corpo a corpo,
pele a pele,
nos engatamos no ritmo
também.

MEU DESEJO

é prata mas é ouro
é fogo mas é nuvem
é tempero mas é sussurro
é sangue mas é infecção
é fala mas cala
é falo mas é de fato
é sal mas é açúcar
é flor mas quer o beija-flor
é encontro mas quer a busca
é cego mas é sério
é ida mas quer volta
é antes mas quer depois
é hoje mas foi ontem
é hoje mas quer amanhãs
é noite mas quer manhãs
é fogueira
é perfume
é comparação

AOS NAMORADOS: Aproveitem a lua cheia, o feriado que está aí bem próximo e assumam o seu amor. Encontros devem ser vividos e não escondidos, escamoteados, disfarçados de que não são de amores. Asas a seus amores. Eu, sacerdotisa grega e mineira, os abençoo. Vivam !

Poesias: Odonir Oliveira (coletânea de versos já publicados nesse blog sobre o tema)

Fotos de arquivo pessoal  (já publicadas nesse blog)

Vídeo: Canal Verônica Sabino

Veja também:

Dias dos namorados I

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Dias dos namorados II

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Dias dos namorados III

Dias dos namorados III

Dias dos namorados IV

Dias dos namorados IV

Dias dos namorados V

Dias dos namorados V

Dias dos namorados VI

Dias dos namorados VI

Dias dos namorados VI

SANDRA

Voltava da visita à maternidade. Junho quente.

Ver aquela pequena Natália no colo da mãe mexeu com sentimentos guardados a sete chaves, em sete cofres de deleites. Nada havia remexido tanto em sua sensibilidade nos últimos muitos anos. Sandra era pedra. Nenhuma gracinha de ocasião a adocicava mais. Era 12 de junho e Natália nascera na véspera. As ruas na noite, no meio da semana, estavam movimentadas. Os bares cheios de casais. Sabia-se que os motéis, também.

Lembrou-se, enquanto dirigia, de alguns amores, dos reais e dos inventados. Não, não queria amor algum mais. Bobagem, não queria.

No sinal, o trânsito lento. Nas cadeiras e mesas na calçada, os casais predominavam. Deduziu o amolecimento das carnes com o álcool, as palavras sussurradas nas orelhas, um toque de pernas, umas palavras especiais, uns ditos e reditos íntimos e de fácil reconhecimento. Viu identidades entre aqueles pares de calçada.

Nada por ali lhe era novidade. Tudo vivido. E muito. Nada daquilo iria em frente. Acabaria, como sempre foi. Muitos diriam Mas o que vale é o momento, se aconteceu, que bom que aconteceu; a vida é feita de momentos; hoje você está aqui, amanhã ali; a vida é assim mesmo.

A visita à maternidade revolvera sentires. Por que estaria em dúvida? Começava a envelhecer e sentia a falta de um homem a seu lado? Não, casado, na mesma casa, nunca mais. Mas um parceiro de gostos e valores semelhantes, sim. Tinha vida sossegada, independência financeira, sem imóveis e patrimônio a dividir. Nada de material. Nunca. Talvez um homem com quem pudesse estar e bem. Talvez fosse isso. Mas por que agora? Não podia ter sido a ida à maternidade o detonador desse processo. Não, não podia.

Lembrou-se, em seguida, de todos os seus açúcares de antes, aqueles mimos e afagos particulares aos amados, de sua vontade de se sentir amada e do prazer de ter sido amada, de fio a pavio, em madrugadas de embevecimento.

Não. Era um espantalho para homens fracos, já lhe advertira a mãe. Homem não gosta de mulher forte, estudada, independente; querem sentir que dominam, que mandam, que decidem; homem não gosta de mulher assim, eles fogem, vão atrás das outras.

Sinal fechado. Trânsito parado. Casais saem do cinema de mãos dadas – filme do cartaz NUNCA TE VI, SEMPRE TE AMEI – outros brigam briguinhas de esquentar camas depois; outros, ainda, caminham abraçados em um erotismo totalmente explícito. Imagina então todos os depois.

Sinal aberto. Segue.

Lua cheia no céu.

Que amor é esse, meu Deus?

Versos da memória.

SAUDADES INTERNAS

Saudade de beber vinho no mesmo copo e sempre.
Saudade de dançar samba sem parar, de rodopiar e de rir muito com isso.
Saudade de falar dos maiores problemas nacionais em cadeiras duras de botecos
Saudade de companheirismo, cumplicidade, parceria
Saudade de grandes brigas teóricas, históricas e poéticas.
Saudade de colo canhoto, de mãos ásperas, de barbas por fazer.
Saudade de poder chorar sem pejo, de blasfemar sem penitência e de solfejar o nada.
Saudade de correspondência interna.

RENDEZ-VOUS

sopro de labaredas
fogo na pele
entardecer cúmplice
colóquio de brumas
sabores de carne
corpo em rumo
corpo em sumo
corpo em frente

sopro de brisa
colóquio de nuvens
perfume de unhas
tonalidades de outonos
olfato de azuis
sabores de sedas
corpo em sumo
corpo em frente

sinfonias

CORRESPONDÊNCIAS

O tempo trouxe a lente da maturidade
O tempo trouxe exigências outras que não as anteriores
O tempo trouxe uma seleção maior que a natural
O tempo trouxe correio de cartas raras, selos raros, entregas raras.
Há no tempo uma busca da correspondência singular, antes inexistente.

PENUMBRA

laços lassos
pelos pelos
ondas umas ondas outras
céu e terra
voo e marcha
aninhar no ninho
alisar o dorso
alisar o fogo
alisar o firmamento
janela lançamento
janela embarque
janela pouso
porta entrada
porta estrada
porta espada
corpo esponja
corpo porto

“Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.” Guimarães Rosa

Leia também:

Dias dos namorados I

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Dias dos namorados II

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Dias dos namorados III

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Dias dos namorados IV

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Dias dos namorados V

Dias dos namorados V

Texto e poesias: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Cícero Nascimento

Dias dos namorados V

ENCONTROS

Ama-se o amor
Ama-se a busca do outro em si mesmo
Ama-se um acordo de pensamento que batiza encontros
Ama-se um gesto, um riso, um toque, um olhar
Ama-se um jeito, um comportamento, uma capacidade
Ama-se um cheiro, uma seiva, uma pele.

FRANCISCO, O POETA

Era um homem apaixonado. Mas muito apaixonado. De paixão fácil. Encantava-se pelo feminino de forma quase primitiva mesmo. E escrevia versos. Enviava versos. Dedicava canções nas duas rádios da cidade. Vez ou outra usava pseudônimos e … amava.

Alguns atribuíam esse seu comportamento ao de todos os poetas, muita lírica e pouca concretude. Poetas – acredita-se- gostam de solidão, de meditação, de reclusão. Poetas são seres esquisitos mesmo.

Houve momentos em que, de forma quase incompreensível, mostrou-se em um eu lírico feminino. Ora, ora, Chico Buarque não faz isso tantas vezes, por que ele não poderia fazê-lo também?

Era distância a sua inspiração, não realizava o que queria. Tinha covardia na atitude. Tinha medo de o objeto do amor não ser o que esperava que fosse. Temia o concreto, gostava da idealização, das musas, do etéreo. Pelas madrugadas, que dormia já quase dia claro, era nelas que lia, bebia e escrevia. Fazia amor com as madrugadas, portanto.

BUSCAS

Sigo na direção
é sim é não.
Transformação.

Janelas abertas
vento pelos ouvidos
esperas na pele
torneios entre razão e emoção.

Uma canção
Duelos constantes
é sim e não.

Rotas sinuosas
casas de menina
cores de menina.
Encontro de mulher.

HOMEM NU

Há em ti um medo insofismável de ser
Há em ti um esconderijo de tempos espaços externos e iluminados
Há em ti um entranhar-se em ti, como caverna de um Platão inédito
Há em ti espaços impenetráveis até por ti mesmo.
Há em ti um tom fúnebre de vazio existencial
Há em ti um carpe diem funesto e não libertador
Há em ti enigmas segredos secularmente indecifráveis
Há em ti um fugere urbem que se pretende equacionador
Há em ti uma rebelião dos valores estamentais sociais religiosos
Há em ti um sagrado íntimo trancado em celas-cárceres-degredos
Há em ti um código de valores herdado e mantido a ferrolhos
Há em ti um reflexo que não é o de ti
mas o de um outro que a ti intentas impor.

AMAR É O QUÊ ?

Ah, meu amor
eu não esperava mais amar.

Amar é difícil:
ficamos frágeis, inseguros, duvidosos.
Amar faz-nos ciumentos do que antes não éramos
Amar deixa marcas jamais cicatrizáveis
Amar faz entregar aos outros nossas incapacidades.

Amar nos torna
compulsórios demais,
cotidianos demais,
corriqueiros demais.

Amar nos faz beber lirismo
em um copo
em um livro
em uma flor
em uma risada tola.

Amar é um sentimento,
é uma parte,
é uma fase,
é uma tormentosa viagem
em um oceano a esmo,
é um deleite de senhas descobertas,
é um sentar-se ao lado, nos silêncios compartilhados?

Amar se parece com o quê?

Com um corpo dentro do outro
como encaixe de engrenagens que se integram
oferecendo trabalho?
Com um tempero harmonioso de manjericão, alecrim e salsa?
Com água de cachoeira pesando nos ombros
qual chicotadas de ânimo?
Com perfume de mãos deslizantes sobre flores delicadas?

Amar se parece com o quê?
Ah, meu amor
eu não esperava mais amar.

AMOR QUE HAVERIA

“É um filme kafkaniano”,
entrega o Ele.
“Eu diria que é uma comédia romântica”,
complementa a Ela.
Ela que caminhou por espaços íngremes
entende que os amores são múltiplos, concomitantes, diversos entre si.
O amor é um poliamor.
Ele acredita que cada tem sua história anterior que interfere.
Ela acredita que é amor aquilo entre os dois.
Ele pensa que o amor é simples, não é necessário ser complexo.
Ela duvida disso e pensa que o que Ele diz não é exatamente o que sente.
Ela carece dEle.
Ele bebe outros lábios e não carece dEla.
Ela se ressente de não ter podido tocar nEle e mostrar-se Ela, como é.
Ele nunca mostrou interesse em que Ela mostrasse como é.
Apesar disso, há sons e imagens sensíveis que povoam um universo inteiro
entre Ele e Ela.
Negar o óbvio é fuga.
Negar o óbvio é medo.
Negar o óbvio é preferir o simples.
“Nada vai mudar meu mundo”- sentencia Ele.
“Tudo já mudou o meu” – declara Ela.

FRANCISCO

risco no disco
medo abandono introspecção
incompreensão
susto temor insatisfação
dor tristeza intrínseca reflexão
risco no disco
choque vulto morte
choque juventude morte
risco no disco
sozinho na multidão
escondido nas luzes da cidade
escondido na música alta
escondido nas páginas dos livros
risco no disco
fuga para si mesmo
fuga de si mesmo 
risco no disco
arranhão ferida cicatriz marca
incompletude
escafandrista de risos alegrias levezas
risco no disco
pela eternidade

Naquela manhã levantou da cama, outro. Iria ao encontro da mulher que acreditava amar. Não poderia continuar mais assim. Seria covardia demais. Foi.

E continuam juntos há 4 anos.

Não existem coincidências, mas afinidades e sintonias. Não há como negar evidências de trilhas, ramais e caminhos. A vida segue e nela há encontros, desencontros, reencontros. A vida é inexplicavelmente cuidadosa.

Veja também:

Dias dos namorados I

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Dias dos namorados II

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Dias dos namorados III

Dias dos namorados III

Dias dos namorados IV

Dias dos namorados IV

Texto e poesias: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Regina Fernandes

Dias dos namorados IV

12 DE JUNHO, NÃO SE ESQUEÇA DE SUA NAMORADA !

AMOR DE HOMEM

Na hora do almoço Pedro Paulo repara no cartaz da vitrine, a caminho do restaurante. Um portentoso primata segura uma florzinha do campo. Acima, lê-se uma chamada comercial para o dia dos namorados. P.P. lembra da data, então.

Segue pensando no que faria para não deixar a data passar em branco. Sairia da Bolsa de Valores bem tarde, o que o impossibilitaria de comprar qualquer coisa para Virgínia. Depois, será que daria tempo de irem jantar fora? Não fizera reserva e sabia que não encontraria mais mesa nos restaurantes de que gostavam, assim em cima da hora. Foi almoçar com essa questão a resolver.

Virgínia não perdoaria qualquer negligência ou esquecimento. Era muito cuidadosa com datas e considerava menosprezo não serem respeitadas.

No caminho de volta do almoço, na loja de rua, avistou um lindo anel, tinha um rubi incrustado no ouro branco. Calculou a medida do anelar de Virgínia – qualquer diferença a joalheria faria a adequação posteriormente. Mandou entregar com um cartão que fazia menção aos 20 anos em que estavam juntos, desde o namoro até o casamento. Mais à frente, naquela floricultura de flores importadas, escolheu belíssimas papoulas, rosas vermelhas graúdas, o buquê, e mandou entregar em sua casa. Queria que tudo estivesse com Virgínia, antes de ele chegar da Bolsa de Valores.

Virgínia adoraria, tinha certeza. E o que mais Pedro Paulo queria era ver sua esposa feliz.

Juvenal vai tomar café na padaria, vê o cartaz o cartaz da vitrine, a caminho do restaurante. Um portentoso primata segura uma florzinha do campo. Fica ali, na hora do almoço, tomando sua média com pão e manteiga. Não consegue desgrudar os olhos do cartaz.

Tinha ainda muita parede pra lixar e pintura pra fazer no escritório de advocacia. Pelo menos mais uns 3 dias. Não recebera nada como adiantamento. Ao contrário, fora recomendado a ser rápido no trabalho. Pra ele também era bom, terminando um, já poderia começar o outro do andar de baixo, a imobiliária.

A imagem do macaco com a florzinha na mão amoleceu Juvenal. Queria mesmo era dar um belo dum presente pra sua mulher, a mãe de seus 2 filhos. Maria trabalhava na cozinha da escola municipal, deixava os meninos na creche ao lado e vivia uma vida danada de dura. Ambos, sem parentes na capital, guardavam doces recordações do interior, de onde tinham vindo. Mas Maria bem que merecia um presente. Pensou numa lembrancinha apenas, contou o dinheiro do bolso. Pouco. Ainda tinha que comprar o pão e o leite na volta, na padaria perto de casa. Não ia dar mesmo. Tinha os passes pro ônibus e pro trem e o dinheiro do pão e do leite.

Foi caminhando. No fim da tarde, ao passar pela avenida, havia umas moças distribuindo flores, já embaladas, para as pessoas que passavam. Era uma homenagem ao dia dos namorados, vinha com um cartãozinho onde se lia:

Juvenal pegou aquilo com uma vontade! Parecia que tinham lido seus pensamentos. O mundo conspirava a seu favor.

Foi no ônibus planejando tudo o que ia dizer à sua Maria, igual tinha visto num filme na TV.

Maria, meu amor !

OFERECIMENTO

Ofereço-te a água dessa lagoa
Para beberes tuas imagens
Ofereço-te a luz desse céu
Para tuas telas de muitos tons
Ofereço-te essas areias macias
Para mergulhares teus pés
Ofereço-te um barco quase morto
Para o reavivares e chegares ao infinito
Ofereço-te essa flor
Para encantares sentimentos

Ofereço-te um poema
Para fazeres com ele o que quiseres.

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Dias dos Namorados II

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Dias dos Namorados III

Dias dos namorados III

Texto: Odonir Oliveira

Fotos: 1ª e 3ª retiradas da Internet

2ª e 4ª de arquivo pessoal


Vídeo: Canal Rousseau

Dias dos namorados III

AMORE MIO

Mais de 30 anos. Não fugiria daquilo. Não dessa vez. Disse que iria, foi.

Na frente do restaurante. Tudo é novo e antigo. Tudo é afago, carinho, encontro. Mais de 30 anos. Não fugiria daquilo. Não dessa vez. Disse que iria, foi.

Quantas vezes quis procurar por Lorenzo. Mas onde? Teria se casado, estaria naquela cidade ainda, teria filhos, o que teria acontecido com Lorenzo, depois de tudo?

Naquela tarde chuvosa, dois jovens da colônia italiana marcaram de se encontrar e de ficarem juntos. Ali, naquele restaurante, com pouco dinheiro, juntaram o que haviam conseguido e jantaram muito bem. Havia música ao vivo. Conversaram muito, riram das coisas mais tolas e até das menos tolas. Não faziam planos. Eram conhecidos desde crianças, famílias quase vizinhas, festas da colônia com muita polenta, muita macarronada, música e dança. Olhares e afetos semeados.

Começaram a namorar escondido. Mas por que escondido? Temiam intromissões, determinações, achavam-se um tanto anarquistas como seus antepassados ao chegarem ao Brasil. Queriam inaugurar seu jeito de amar.

E foram muitos encontros pelos campos ermos, muitas corridas nos montes e descidas de perder o fôlego. Tantas mãos pelos corpos, tantos beijos pelos corpos, tantos risos nas bocas e tanto desejo em cofres.

Depois daquele jantar, meio escondidos na cidadezinha próxima, tomaram o trem de misto – como era chamado – e foram deitar juntos em uma pensãozinha no centro da outra cidade.

Lá viram estrelas, luas, sóis, constelações, foguetes, planetas, satélites, sem ordem de surgimento. Era céu demais ali. Perfumes de amores, cores romanas, até uma cançoneta no ouvido, ambos cantaram um para o outro. Um festival de passiones.

Retornaram com dia claro A família da moça procurou a família de Lorenzo informando o acontecido. Os pais do rapaz queriam que os dois se casassem. Ambos disseram que não.

O tempo passou e a italianinha foi viver na capital. Lá formou-se em artes plásticas, cenografia. Envolveu-se com grupos de teatro, mambembou pelo país. Nunca mais soubera de Lorenzo.

Agora retornava à sua cidade, enterro de prima querida. Soube que Lorenzo desejava vê-la. Mandou-lhe recado que estaria no Gino’s, il Candelabro na noite seguinte para jantar. Se ele quisesse vê-la, estaria lá.

Mais de 30 anos. Não fugiria daquilo. Não dessa vez. Disse que iria, foi.

Enquanto espera por Lorenzo, pede as saborosas berinjelas de sempre, o vinho da casa e lembra.

Lorenzo chega e encosta nela. Aperta seu coração em si. Estão ali. Estão ali.

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Dias dos namorados II

Texto: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeos: Canal ChiaraCivelloVEVO

Dias dos namorados II

JOANA D’ARC

Que será da minha vida sem o teu amor, da minha boca sem os beijos teus, da minha alma sem o teu calor …”

D’Arc tinha mais de 40 anos e adorava Ângela Maria. Enquanto cozinhava, lavava as louças, cantarolava versos da cantora. Os moradores da casa sempre indagavam quem seria o grande amor pelo qual D’Arc suspirava há tantos anos. Ela fazia mistério.

Trabalhava há mais de 10 anos na casa dos Silveira, acompanhara o crescimento da menina Michelle, as inquietações do rapazinho Rodrigo. Gostava deles. Os patrões nunca haviam tido notícia de namoros ou encontros furtivos da moça – agora já mulher – desde que começara a trabalhar ali. Domingos de missa bem cedo. Um passeio na praça em frente à igreja, um sorvete, um pastel, um refrigerante. Volta pra casa. Descanso no quarto, televisão, música no radinho. D’Arc era cotidianamente simples.

Morava no quartinho contíguo à casa dos patrões, assim tinha independência, mas não a presença de familiares ou de amigos. Tinha nos Silveira a sua família, considerava assim.

Que amor haveria perdido o coração de D’Arc, que suspirava diuturnamente. E cantava canções de amor com tanta comoção.

Dia dos namorados não lhe trazia amargura, ao contrário, preparava tudo para os patrões, estimulava o rapazinho Rodrigo a presentear a namorada da vez. Enfim, era uma romântica.

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Dias dos namorados I

Dias dos namorados I

Texto: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Mara Ferreira

Dias dos namorados I

ADÃO E EVA

Liz resolvera voltar a São Thomé das Letras. A viagem da década de 90 fora um trem fantasma único. Apagar agora aquilo era importantíssimo.

No quadro da pousada leu


Chegou, chegando. Pousadinha pequenininha, café da manhã bom. Preço bom. 7 dias de paz. Nada de nada pra pensar. Não queria reflexões, análises, nada. Só dias e noites em paz. Luz havia ali. Céu havia ali. Belezas havia ali. Fora de período de férias, aquilo era estar em contato com o criador, a criação ao alcance de suas mãos. Não queria conversa, não queria dizer de onde vinha, nada. A dona da pousada lhe cedeu o quarto cuja sacada se abria para o belo por-de-sol da cidade. Tão incensado por toda a gente.

No primeiro fim de tarde, ficou na varanda do quarto, bebendo vinho e namorando o céu. Parecia mar aquele céu. Ela preferia céu, lago, rio, cachoeira. Mar… já havia se afogado demais nele. Agora, céu. Leu, escreveu, ouviu música, leu, escreveu, ouviu música.

Na manhã seguinte, após o café, rua. Visitas como caminhante do sol, dos céus, das estrelas, dos rios. Na hora do almoço, um olhar ou outro, sem nenhum interesse pelos visitantes, poucos visitantes ali.

No fim de tarde correu porque a dona da pousada lhe avisara que faltavam poucos minutos para o espetáculo diário. Correu. Foi, sentou, tomou seu vinho. E ganhou companhia.

– Posso beber do seu vinho?
– Só tenho essa taça, desculpe.
– Tenho esse copo aqui – retirando-o debaixo do poncho andino. Me serve um pouco?
– Ah, bom. Mas promete ficar quietinho aqui do meu lado? Se ficar, bebe comigo.
Fez sinal com os dedos na boca de que aceitava o combinado. Ficou.

Ficou por mais 6 dias por rios, lagos, caminhos, trilhas. De noite, comidinhas gostosas, de dia sorvetes na farmácia porque era onde vendiam sorvetes por lá.

Menino mais novo, vivo, sem medos e temores, atrevido até. Namorado ideal que vai. Não teme o não. Parece que o não já tem, então o que vem é bônus.

Riram muito, encheram a cara e os corpos de alegrias, juventude, riscos de peles e pelos. Foram dias de muita luz os de Eva. Adão a levou por picadas e pinguelas de muitos prazeres, um menino-homem de muitos talheres.

Por tardes e noites era companhia silenciosa como Eva gostava. Era contemplação do aqui, do acolá. Eva estava adorando aquela volta a São Thomé das Letras.

Numa manhã trouxe-lhe um poema que havia escrito, logo cedo.

ODE AO POR-DO-SOL

Ó céu,
que rebelde,
assumes todas as dores da terra
retorces a auréola da luz primeira
tornando-a última,
como se com isso
punisses todos os homens
por erros culpas desvios.

Ó céu,
que punes a claridade do dia
enrubescendo-a em sua moldura
escancarando-a com carrancas soturnas
para poder dela por fim se livrar.

Ó céu,
que queres,
se quanto mais duro te tornas
mais doce e lírico
te esbanjas
aos que te contemplam?

Que desejas, ó céu,
com fascinante beleza,
que por minutos,
liquida-nos,
arrebata-nos
como num golpe fatal.

Adão foi paraíso para Eva, exatamente como ela acreditava que seria.

Texto e poesia: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal Lilith Aldreycka

Homem machado

ESPÍRITOS DA FLORESTA

Espíritos domesticam
olhares, sentires e ficares,
pelo cheiro, pelo vento, 
pelo sons do mato do sertão.
Espíritos atraem por rochas, por águas, por céus.
Espíritos nas florestas 
polinizam almas inquietas
Para sempre.

AQUELA FIGUEIRA

Na vereda
encontrei aquela figueira.
Fiquei ali.
Copa magnífica.
Dos verdes, todos.
De denso, o tronco.
De lastro, histórias
De expressão, singular.
Estáticas, ambas.
Incomum.
Raízes para sempre em mim.

RAÍZES DE HOMENS

Há certos homens que têm caules vigorosos.
São eles que semeiam a terra
afagam sementes
exalam perfumes de flores
recolhem os frutos doces.

Há certos homens que encostam as mãos na terra
a fortificam com seus dedos ásperos
a revolvem com palmas ardentes
a fertilizam com braços seguros.

Há certos homens que têm raízes em lugar de pés,
fincam-se inexoravelmente.

HOMEM MACHADO

tudo mato
não dá frutos faz anos
tudo mato
tem que cortar
tem que tirar as raízes
tem que limpar tudo
tem que por fogo
tirar as raízes

a boca num sorriso plástico
a eficiência mortal
o prazer da destruição contumaz
arrancar tudo
o auto-elogio do trabalho rápido
o aplauso a si mesmo
dores de raízes
dores de troncos
dores de folhas
dores de flores
frutos aos pedaços no chão

o homem machado
exala morbidez
pelo olhar
pelas mãos
pela fala

os verdes do cenário 
ausentes
os verdes da moldura
ausentes
o homem machado presente

Poesias: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

Vídeo: Canal NEBELWARNER

Objeto não identificado

Alguém ligado em OVNI?
Hoje 6h da manhã, fotografei o sol já brilhando com força em João Pessoa. Foram 4 fotos. 3 tiradas em sequência saíram escuras como se ainda não estivesse claro (e já estava). A 4ª saiu com a luminosidade que eu avistava. Observando as fotos, percebo um objeto ao lado esquerdo do sol. Ele muda de posição. Você também vê isso? Sabe o que é?”
– Heloísa Ramos

Via-Láctea
XIII

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.

Olavo Bilac, do poema ‘Via-Láctea – XIII (1888), no livro Antologia: poesias. São Paulo: Martin Claret, 2002. p. 37-55: Via-Láctea. (Coleção a obra-prima de cada autor).

SORRISO DE ESTRELA

É quando no desespero de mim,
que encontro a ti
sorrindo repetidas vezes
com passos ouvidos
em reflexos mínimos
em espaços imprevisíveis
em momentos inesperados.

É quando miro estrelas
que encontro
teu lume no delas
tua silhueta na delas
teu dorso incomum no brilho delas.

É quando escurece
que estrelas em ramalhetes
te trazem a mim,
e em ti permaneço
pousada no céu.

Para a amiga Heloísa Ramos, minha inspiradora. Sempre.

Poesia: Odonir Oliveira

Fotos de arquivo pessoal

1ª e 2ª fotos de Heloísa Ramos- 4/6/ 2019- João Pessoa

Vídeos:

1- Canal Ich Bin

2- Canal Odonir Oliveira