![](https://poesiasdemaosquesentem.wordpress.com/wp-content/uploads/2024/05/37688592_677634462584547_4425526283094458368_n.jpg?w=662)
MEU TEMPO AINDA É ESSE?
Não sei se compreendo frases prontas, gritos de ordem, clichês sobre o envelhecimento. Tudo me parece muito pouco reflexivo, verdadeiro ou real. Como se pode ser contemporâneo a tantas alterações éticas, afetivas, sociais? O quanto há que se ser zen a comportamentos inaceitáveis e compactuar com eles ou pelo menos, naturalizá-los. Acho impossível. Meu tempo já se esgotou? Meu tempo ainda é esse?
Como aceitar que não se considerem mais histórias de vidas, pessoas que acompanharam o nascimento e o crescimento de outras e por essas serem esquecidas, descartadas e até desprezadas? Como ter-se notícia da morte de uma parente apenas um mês depois, via rede social, com o pedido de não se solicitarem respostas do filho, que noticiava seu falecimento e funeral, ocorrido fora do país? Desconsideram-se toda a histórias vividas, todos os aniversários, todos os nascimentos, todas as crises e doenças pregressas e compartilhadas, nada mais deve ter relevância? Meu tempo ainda é esse?
Quando em reflexões sobre nossas angústias comuns, minha amiga Marta, falecida há 3 semanas, sempre dizia “Sabe o que é Odonir? É que para eles isso não é importante”. Esse não é o meu tempo mais. Viver para enriquecer, para ter mais do que o necessário para se viver bem, é um exemplo terrível que vem sendo dado aos filhos dos filhos. O que farão também esses a seus pais?! Meu tempo ainda é esse?
Constato o nível intelectual e social cada dia mais rebaixado quanto à música, à literatura, ao jornalismo. Causou-me a chamada vergonha alheia assistir a uma repórter da cidade entrevistar essa semana um cantor sambista, em evidência, e logo declarar ser sua fã desde os 12 anos e fazer uma pergunta medíocre a ele. Ela tem 24 anos e para ela 10 anos passados já são história. Imaginem vocês. Sem conteúdo, sem postura, sem preparo. Publicado no Instagram. Meu tempo ainda é esse?
Não se consegue mais conversar. Nem pessoalmente, nem por telefone. Ainda que você pergunte se a outra pessoa pode falar naquele momento, se está ocupada etc. ainda assim, mesmo respondendo que está disponível, não fala por mais de 5 minutos. A linguagem, a capacidade de refletir, de ouvir, de trocar experiências, informações já não existe. Todos estão acostumados a apenas, e solitariamente, rolar dedo no celular, curtir, compartilhar frases feitas, clichês e autoajuda genérica. Meu tempo ainda é esse?
Por outro lado, haverá sempre quem citará versos de Paulinho da Viola “Meu tempo é hoje”. Talvez alguém mencionará que estar cercado por jovens nos torna mais jovens. Quem sabe ouvirei que ser saudosista é muito ruim etc.
Concluo que esse não é mais o meu tempo, nem pelos comportamentos verificados socialmente, nem pela urgência gigante de enriquecimento e ostentação, nem pela falta de empatia e de sinceridade nas relações pessoais, nem pela falta de coragem de as pessoas serem o que são e não o que, cabotinamente, parecem ser.
Em 2018, escrevi essa página em homenagem aos 50 anos de casamento de meu irmão Odecio e de minha cunhada Nena. 50 anos na estrada da vida– https://poesiasdemaosquesentem.wordpress.com/2018/07/25/50-anos-na-estrada-da-vida/. Hoje nenhum dos dois está mais por aqui.
Texto: Odonir Oliveira
Foto de arquivo pessoal
Vídeo: Canal Biscoito Fino
Contando histórias, fazendo história, perpetuando história e histórias. Seu tempo é este, pois a história e as histórias, sobrevivem ao tempo…
CurtirCurtido por 1 pessoa
Sei. Leia a de amanhã, Estevam.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Já na expectativa!
CurtirCurtido por 1 pessoa